- Um filho? – disse ela com espanto. Como ele podia querer isso dela? Não era justo, não era ele quem devia decidir quando eles teriam uma criança. Não era egoísmo, era falta de capacidade. Não se sentia apta a colocar alguém no mundo. Era demais pra ela. Além de uma injustiça com o ser que lançariam nesse mar de insegurança.
- Um filho! – disse-lhe achando que compartilhava a melhor novidade da face da terra. Sentia-se a vontade para ser pai ao lado dela e fazer dela a mãe de seus herdeiros. Era o ato mais altruísta que pensou. A maior declaração de amor que podia fazer. Isso, sim, era amor. Contou-lhe seu desejo aguardando que ela pulasse no seu pescoço e beijasse a face até ficar avermelhada. Ela nada o fez.
Queria chorar de ódio. Como ele podia ser tão egoísta. Ela tinha tantos planos para ela. Terminar a faculdade, fazer o mestrado, doutorado. Queria emagrecer dez quilos. Operar a vista. Queria voltar a dançar e ele nunca se disponibilizou a ir com ela. Quis companhia para ir ao mercado e ele estava ocupado demais trabalhando.
Havia se decidido: aquela mulher era mulher da sua vida. Não podia deixar que ela se afastasse. Precisava mantê-la colada ao peito. Afastá-la de todas as dores do mundo. Aquela era a mulher que escolheu pra chamar de sua. Não era possível que ela não entendesse isso. Achava que se tivessem um filho deles, estariam conectados pelo resto da vida.
Na verdade, ela estava confusa. Não sabia nem se queria ter contato com aquele homem para o resto da vida. Uma vida é tempo demais. Lembrou-se de todas as renúncias que teria que fazer e pôs-se a chorar. Via-se presa a uma rede de carências da qual nunca conseguiu se desvencilhar. Era isso! Só estava com ele para suprir essa vontade de não estar sozinha consigo.
Desde que ela chegara, o apartamento estava cheio de vida. A toalha que ela deixava na cama, a mania de comer vendo televisão. Desde que ela chegara, os banhos eram cheios de amor. O modo como ela ensaboava o corpo todo para depois deixar a água levar a espuma. O jeito como escorria o pente nos cabelos lisos e pretos. Imaginava o mesmo cabelo para o filho que teriam.
Casamento já seria um golpe grande demais para a pretensa liberdade vivida por ela. Mas essa idéia de doido de ter um filho ultrapassou as barreiras da insanidade.
- Então, quer ter um filho comigo? – perguntou mais uma vez na esperança de que a resposta fosse positiva.
Neste momento, ela queria correr, sumir, voar, explodir. Ela desejou chamais tê-lo conhecido para que não precisasse viver isso. Mas covardemente respondeu que queria o mesmo filho. No fundo, sabia que só uma criança preencheria a solidão de si mesma vivida por ela.